O ano novo começou cheio de velhas notícias. Explosões matando crianças, crise econômica, desemprego. Perspectivas sombrias contrastando com a expectativa messiânica de que o novo presidente possa redimir tudo e todos – Obama de deus, tirai os pecados do mundo... Pobre Obama! Nem todo um rebanho de cordeiros conseguiria expiar tantas culpas!
Em 1932, Einstein escreveu a Freud, indagando se haveria um modo de livrar a humanidade das guerras. Freud, que nessa altura já não professava mais o otimismo de três décadas antes, respondeu-lhe, em resumo, que a única aposta possível estava na vitória da civilização sobre o desgoverno das pulsões destrutivas, sempre lá, à espreita, prontas a se manifestar. Nenhum deles poderia saber, então, que nos treze anos subsequentes o mundo testemunharia justamente o cúmulo da anticivilização.
A barbárie venceu a cultura, ironicamente em nome da purificação da raça humana. Ironicamente, mas nem tanto, pois talvez nunca antes a matéria prima de que somos feitos, nós humanos, tenha estado tão à mostra, tão explícita como naquele momento histórico e, infelizmente, em tudo o que se seguiu a ele. O nazismo não matou “apenas” seis milhões de judeus e outros tantos comunistas, católicos, soldados e inocentes que estavam simplesmente no lugar errado na hora errada.
O nazismo matou algo mais: matou a ilusão do humano sobre si próprio. A idéia de um homem primordialmente bom e corrompido pela sociedade foi-se, definitivamente, por água abaixo. Despido de qualquer disfarce possível de bom-mocismo, o mundo atravessou o final do século XX mergulhado nessa desesperança crescente de si. Um a um caíram os ideais, as utopias, as bandeiras. Há vinte anos, o muro de Berlim levou ao chão o resto, já bastante arruinado, da fé na promessa socialista.
O que nos sobrou? Quando um sujeito entra numa creche e atira em bebês, ou quando outro simplesmente estrangula duas meninas porque o pai delas lhe devia dezesseis mil reais, o que nos resta? A época é, sem dúvida, bem promissora para fanáticos e fundamentalistas de todos os tons, prontos para cobrar as novas indulgências rebatizadas de dízimo, donativos e congêneres.... Se esse não é o caminho que queremos, o que nos resta?
Muito pouco, na verdade. Quase nada. Resta-nos apenas a perplexidade. Resta-nos o espanto. A partir desse nadinha, teremos que nos por a inventar. Inventar um mundo que supere o estrago, não pela via do saudosismo, porque não temos mais como tapar o espelho depois que já nos vimos nele, nus. Temos de recriar o mundo, nós, humanos-deuses do século XXI. Temos de reinventar a civilização, e torcer para que, afinal, a aposta de Freud estivesse certa.
Ao trabalho, amigos! À luta! Cada um com suas armas!
A minha, é a palavra.
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imgem: Criança Geopolítica Observando o Nascimento do Homem Novo, Salvador Dali
Um comentário:
Olá, Márcia!
Parabéns pela retomada! Adorei as traduções e sua crônica "Pensando na vida:2009". Penso que apesar dos desencantos, creio ainda haver utopias ainda não realizadas. A Democracia direta eletrônica é uma delas.
Estou retornando também.
Abraços ET-Linos
Dênis
"Feito de bits, links e teia
Pra que não me desmaterialize
Me clique, me blogue e me leia!"
http://denismoura.blogspot.com
"Se todo o poder emana do povo, então
que venha a democracia direta eletrônica e o povão, via Internet,
Celular ou TVDigital, assine leis certificadas digitalmente
e as realizem pela força das ações articuladas no mundo virtual para o real."
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