tiro o relógio e páro:
chegou a hora da reconstrução
por tantas ruas percorridas
sobraram vestígios de sonhos ardentes
mas, nas esquinas escuras,
esperavam atentas
bocas imensas e garras potentes
assim, abatidos e cambaleantes,
deixaram-se prender por palavras-correntes
revejo num instante meus caminhos
e descubro, aqui e ali,
minha revolta rarefeita, aos pedacinhos
reúno-a, quebra-cabeças caleidoscópico,
numa totalidade que é estátua
e farrapos, muda e inerte:
revolta fria não move moinhos...
busco nas tempestades o fogo para aquecê-la
retiro um pouco de luz de cada estrêla
e logo a tenho como nova, renascida das cinzas
a fênix utópica que um dia ainda
alçará vôo para jamais pousar
ciente de sua missão infinita:
lutar
na minha canção cabem flores
- que brotem cravos das roseiras!
e quero ver gente marchando
braços dados, às fileiras,
como exército desarmado e desprovido de trincheiras,
caminhando simplesmente rumo à vida verdadeira
um mundo justo, a Terra em paz
o homem dignificado em seus atos
simples é a meta dos meus desejos
e se as contingências futuras
tornarem-me fraca ou descrente
espero por um filho que me acorde
e comigo replante a dissonância
nos corações que dormem
conformados e imprudentes
* encontrei este poeminha nuns papéis antigos... ele foi escrito em 1983... eu tinha, então, 21 anos, não era ainda médica formada, não era mãe, mal tinha começado a namorar o pai dos meus filhos... é um texto ingênuo, por um lado... mas fiquei feliz por reencontrá-lo e, sobretudo, por me reencontrar nele, quase três décadas depois... fiquei feliz também pelos filhos que tenho e que, de fato, me redespertam cotidianamente para a vida, para a necessidade de mudar, de inventar, de refazer, de subverter, de revolucionar... dedico, então, estas SEMENTES para ulysses e amanda.
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