era bonita a menina
e a vida toda clara,
reluzente em bordados de suave cor-de-rosa,
recendia a filhoses,
bolinhos de chuva e brigadeiros
e a cada dia seguia-se outro
no passar delicado e descontínuo
de um tempo quase rotineiro
foram sutis as mudanças
e vieram tão silenciosas
que marcaram faces e flores
com quase imperceptíveis sinais:
umas rugas, menos brilho
aqui e lá um esmaecimento de cores
uns sonhos a menos, nem sempre vívidos
umas lembranças a mais
porém, em algum ponto do ser,
entre a pele e as entranhas
o agora e o antes se fundiam
num pulsar sépia de desejos
e, para além do corpo, uns beijos
carícias, companhia e cálida intimidade
produziam ondas de vida
onde a morte já era tamanha
e, em algum ponto do cosmo,
entre a luz pálida e o brilho de estrelas
as memórias embaralhadas
reconstruíram o caleidoscópio dos dias:
puseram pontos, pincelaram vírgulas
recontaram a movediça métrica,
revestindo o cotidiano insosso
com retalhos de pura poesia
imagem: Danceuses en Bleu, Edgar Degas
Um comentário:
Márcia,
que delicadeza há
em cada estrofe...
Lindo!
Beijo,
Doce de Lira
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