melhor teria sido ir em frente
vida afora, desatenta,
na placidez azul e melancólica
da quase repetição cotidiana
sem tropeço, sem soluço, sem surpresa
(é que nunca se sabe ao certo
como virá a ferida)
quando o sangue veio em jorro
o universo contorceu-se
o mundo gritou em cólicas
imerso no inesperado vermelho
o corpo, a estrada, as certezas
(é que nunca se ouve direito
a antiga voz que, sussurrando, grita)ainda que atordoada,
um pouco trôpega e perplexa
pôs-se em marcha pois, sedenta,
intuía outras cores na entediada paleta
a tingir risos, esperas, tristezas
(é que nunca se pensa a tempo
que a tinta é sempre finita)
melhor teria sido, quem sabe,
seguir cega em mundo negro
mas o olhar tingido de luzes
se recusa ao escuro e ao deserto
é ávido de prazer, de movimento e beleza
(é que sempre há um pulsar que acende
mais e mais a veia colorida)
(é que nunca se vê bem claro
qual é ponto final da vida)
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2 comentários:
E como é difícil pintar um quadro sequer dessa vida: abastrato, realista, pós-moderna. As cores estão à nossa disposição e, como você diz, esquecemos que a tinta acaba. Que difícil é esse caminhar da vida. Cheio de tropeços e machucados. Feridas que não prevemos. Entretanto, sua poesia displicintemente flana entre os pólos de tensão e liberdade que fruimos e dão a idéia do que é a síntese do homem, sua necessidade de viver e construir. É completa, serena e com uma nota levemente melancólica que apaixona. E seguimos amando, odiando. Caminhando, correndo e caindo. Pintando e acabando. Vivendo uma vida inesperada e planejando sonhos de um ponto final que seja só nosso.
Quanto talento, Márcia. Linda poesia. Um beijo.
É tão bom encontrar esses diamantes justo quando a gente precisa! rsrs
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