domingo, 12 de agosto de 2012

OVO



abro a caixa e olho os ovos
perplexa, encontro o mutante:
em meio às formas perfeitas,
o ovo assimétrico tem arestas
pontas, espículas, cicatrizes

o ovo que não é oval me desafia
interpela a ordenação calma da caixa
e a minha

pelo simples fato de existir
aquele ovo me paralisa
me provoca
e, por fim, desperta em mim
algo disforme
inclassificável e extemporâneo

tomada de movimentos insuspeitos,
renasço, eu-ave de asas frágeis,
eclodo e voo
deixo para trás a casca e o mundo
observo, lá de cima e sorrindo,
a vida sem cores e muda
anterior ao encontro
do inesperado ovo

domingo, 5 de agosto de 2012

A PONTE




a ponte é construída de sutilezas

e mesmo assim, indestrutível
é longa, a ponte
atravessa a cidade, vai por colinas
segue em frente pelas florestas
e flutua imponderável sobre os oceanos

a ponte sai de mim
e vai
desenhando curvas e arabescos
deixando um rastro de sereno cinza
refletindo sóis, luas, crepúsculos
manhãs chorosas, tardes infindas

a ponte é aquarela
de traços leves e doces cores
sai de mim e vai
sem ter retorno
sem pra onde

apenas vai:
ponte


Imagem: Ponte Giverny, Claude Monet