terça-feira, 5 de julho de 2011

SEMENTES *


tiro o relógio e páro:

chegou a hora da reconstrução


por tantas ruas percorridas

sobraram vestígios de sonhos ardentes

mas, nas esquinas escuras,

esperavam atentas

bocas imensas e garras potentes

assim, abatidos e cambaleantes,

deixaram-se prender por palavras-correntes


revejo num instante meus caminhos

e descubro, aqui e ali,

minha revolta rarefeita, aos pedacinhos

reúno-a, quebra-cabeças caleidoscópico,

numa totalidade que é estátua

e farrapos, muda e inerte:

revolta fria não move moinhos...


busco nas tempestades o fogo para aquecê-la

retiro um pouco de luz de cada estrêla

e logo a tenho como nova, renascida das cinzas

a fênix utópica que um dia ainda

alçará vôo para jamais pousar

ciente de sua missão infinita:

lutar


na minha canção cabem flores

- que brotem cravos das roseiras!

e quero ver gente marchando

braços dados, às fileiras,

como exército desarmado e desprovido de trincheiras,

caminhando simplesmente rumo à vida verdadeira


um mundo justo, a Terra em paz

o homem dignificado em seus atos

simples é a meta dos meus desejos

e se as contingências futuras

tornarem-me fraca ou descrente

espero por um filho que me acorde

e comigo replante a dissonância

nos corações que dormem

conformados e imprudentes


* encontrei este poeminha nuns papéis antigos... ele foi escrito em 1983... eu tinha, então, 21 anos, não era ainda médica formada, não era mãe, mal tinha começado a namorar o pai dos meus filhos... é um texto ingênuo, por um lado... mas fiquei feliz por reencontrá-lo e, sobretudo, por me reencontrar nele, quase três décadas depois... fiquei feliz também pelos filhos que tenho e que, de fato, me redespertam cotidianamente para a vida, para a necessidade de mudar, de inventar, de refazer, de subverter, de revolucionar... dedico, então, estas SEMENTES para ulysses e amanda.

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