quinta-feira, 25 de março de 2010

o silêncio absoluto


elas se acumulam

empilhadas

apertam-se umas às outras

proliferam

multiplicam-se em progressão geométrica


me atordoam, as palavras


elas vêm em jatos

jorram

inundam cada fresta de silêncio

com restos de idéias digeridas

expulsam a música, as ondas, o vento


são gulosas, as palavras


queria um dia - um só dia -

viver livre delas

de seus sons, de seus rumores

ouvir-me emudecida

atenta ao ritmo das vísceras

atenta exclusivamente à melodia do corpo nu

despido de letras

ou à cadência do mar

desprovido de rimas


imagem: juquehy (sp), marcia szajbnok

sábado, 13 de março de 2010

flower power


gosto mesmo é das flores de outono!
na floração de primavera, qual a graça?
comum, esperada, desprovida de surpresas...
no outono, não...
as flores de março vêm como um protesto
um desafio ao clima, à ordem, à arrogância humana
sempre tão iludida em saber da natureza...
ah, ledo engano
a natureza, dentro e fora de nós, sempre surpreende
sempre inova
cria
subverte
inventa

as flores dos dias cinzentos são o melhor de nós
o melhor da nossa natureza:
a possibilidade infinita de produzir o inesperado
de desobedecer os genes e os imperativos
de simplesmente abrir-se em cores no mundo em branco-e-preto
de rir alto diante das caras apatetadas e invejosas...

de ousar, tão somente, florir


`imagem: flores, marcia szajnbok
`

segunda-feira, 8 de março de 2010

soneto

como o fim era o começo,
e sem saber qual o caminho,
abriu-se bem devagarinho
rumo ao direito do avesso

como regra, fazia arte
e com tanta tinta colorida
respingou azul na tela da vida
e a hora certa se fez mais tarde

qual o seu nome? apenas Gente:
respira e canta e deseja e ama
e busca e espera e sonha e chama

como vai? vai sempre em frente
fazendo de conta que crê na sorte
fazendo uns versos pra espantar a morte

'