Carlos Drummond de Andrade
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente.
[Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) nasceu em Itabira, MG, e viveu grande parte de sua vida adulta no Rio de Janeiro. Seu primeiro livro, Alguma Poesia, foi publicado em 1930. Sua produção é contínua, destacando-se Brejo das Almas (1934), Sentimento do Mundo (1940), A Rosa do Povo (1945), Claro Enigma (1951), Boitempo (1968), Corpo (1984) entre muitos. Farwell, publicado postumamente, foi o último livro organizado pelo poeta. Embora tenha sido influenciado pelo modernismo, sua obra escapa às classificações. Drummond criou um estilo próprio, criando uma das obras mais significativas da poesia brasileira do século XX a partir da dialética indivíduo-sociedade, mundo interno - mundo externo, e questionando em seus versos a existência e a própria poesia.]
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