sexta-feira, 6 de março de 2009

Diálogos Poéticos: Augusto com Almada


A DANÇA DA PSIQUE
Augusto dos Anjos (1884 - 1914)

A dança dos encéfalos acesos
Começa. A carne é fogo, A alma arde, A espaços
As cabeças, as mãos, os pés e os braços
Tombam, cedendo à ação de ignotos pesos!

É então que a vaga dos instintos presos
-- Mãe de esterilidades e cansaços --
Atira os pensamentos mais devassos
Contra os ossos cranianos indefesos.

Subitamente a cerebral coréia
Pára. O cosmos sintético da Idéia
Surge. Emoções extraordinárias sinto.

Arranco do meu crânio as nebulosas
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!


A SOMBRA SOU EU
Almada Negreiros (1893 – 1970)

A minha sombra sou eu,
ela não me segue,
eu estou na minha sombra
e não vou em mim.
Sombra de mim que recebo a luz,
sombra atrelada ao que eu nasci,
distância imutável de minha sombra a mim,
toco-me e não me atinjo,
só sei do que serias
e de minha sombra chegasse a mim.
Passa-se tudo em seguir-me
e finjo que sou eu que sigo,
finjo que sou eu que vou
e não que me persigo.
Faço por confundir a minha sombra comigo:
estou sempre às portas da vida,
sempre lá,
sempre às portas de mim!

2 comentários:

Beatriz disse...

Estudando Augusto dos Anjos de forma interessante. A dança da psique é um dos meus prediletos. Não sei porque pra mim ele era um gozador. Exageradamente carne em fogo. Irônico

marcia szajnbok disse...

também acho que ele era um gozador! pensamentos devassos batendo nos ossos indefesos é bom demais!!